domingo, 11 de setembro de 2011

O combate da alvorada


Era o ano 300 de nosso senhor, sendo a segunda campanha que fazíamos para salvar Jerusalém das mãos dos impuros. Éramos em 1500 homens, sendo 500 cavaleiros, e mil soldados de infantaria e carregadores de provisão.

O ataque de madrugada a nosso acampamento, mostra da covardia e astúcia por parte dos mouros, mesmo assim, não nos deixamos abater e prosseguimos em combate, onde foi o espanto de nossos inimigos, ao notar que ao contrario de seus prováveis planos, sobrevivemos em número e coragem. Porém, com a chegada da segunda tropa dos incrédulos de Cristo, também fomos abatidos em quantidade maior. 

Ao final da noite sobreviveram apenas dois homens, cada um de sua respectiva fé, eu cristão e meu oponente a alguns metros. 

O sol começava a despontar, e nos olhávamos de longe. Todas as minhas lembranças do passado começaram por passar a minha mente, desde meu jovem treinamento com um dos melhores espadachins do rei da Bretanha, até a despedida da duquesa de Hornia. Pensava em todos os erros, em tudo que poderia ter feito, começando por dizer que a amava, e que atrás da minha indiferença, havia apenas um amor tão forte como o juízo final. 

Meu inimigo me fitava de longe e na sua mão uma espada diferente das dos demais guerreiros de seu clã, que como eu, deve ter sido treinado diferenciadamente em artes de esgrima, pois do contrario não estaria em minha companhia, neste bosque, neste momento. 

Sei que um homem de guerra não sobrevive apenas de esgrima, sendo assim compilei em meus pensamentos que seu senso de honra deveria ser apurado. Este homem deve ter a perspicácia de uma cobra, e a humildade de um pombo. E se este homem é meu único oponente entre um exercito de mil homens, ele merece meu respeito.

Seguro com firmeza a espada, e meu oponente ao ver tal movimento, também cerra seu punho.
Olhava-me de modo diferente, era se como eu me visse por seus olhos. Assim sendo, acredito que também me admirava e me respeitava por ser seu único rival. E apesar de culturas, de mundos e de experiências tão divergentes, ali estavam dois irmãos de alma, habilidade e honra.

Ao correr em sua direção, em movimentos rápidos e calculados, tocamos nossas espadas com violência e rigidez. Nos debatíamos, e nos feriamos igualmente, como se lutássemos contra nós mesmos em um espelho de reflexos vivos. Era para isso que nascemos, era para isso que treinamos, para encontrar na força do semelhante, a honra de merecer o bom combate.

Ambos caímos, e em um tempo de reflexão, novamente nos olhamos.
Havia muito sangue em suas vestes, que aparecia por demais mostrando seu ferimento, o que para um cavaleiro bem treinado, se mostra vantagem. Em mim havia também tal ferimento na região do peito, mas o peitoral de armadura me escondia, e assim havia a ilusão da vantagem sobre meu inimigo.

Nessa hora me levantei e tirei meu peitoral. E ele pode notar o ferimento em meu peito.

De que vale uma vitoria sobre um inimigo formidável, sem a honra de dizer que lutamos de igual para igual, porque era exatamente o que éramos ali, Iguais. Em um gesto nobre, ele me cumprimentou a distancia, com uma reverência característica de seu povo, e eu o saudei com a cabeça em um leve movimento, e assim voltamos a empunhar nossas espadas, sem esquecer quem éramos e porque estávamos ali.

Caminho agora em direção deste homem, e ele também vem em minha direção. 
Nos nossos olhos não há nem medo nem desilusão, ambos entendíamos que a força do tempo limparia todo aquele sangue, e que talvez em outro mundo, eu pedisse ao senhor por aquele guerreiro, e ele pediria a Allah por mim, e que na plena misericórdia de ambos, aquele duelo sagrado das montanhas, ficasse registrado nas areias do tempo, para sempre, nem que fosse somente aos nossos corações.

 Eis que estamos no ano 300 de nosso senhor Jesus Cristo, e que ele nos conceda a vitória, dentro de sua permissão, na conquista de nossa querida e amada Jerusalém, assim vós despeço, amém.





20 comentários:

  1. o que com certeza marcou esse texto para qualquer leitor é o respeito que o "eu-lírico" e o inimigo mantiveram mesmo num combate, mesmo em meio a um conflito. isso me lembrou os campeonatos de karatê, sabe, sei que não chega a dignidade de uma compração com um combate em guerra, mas nos tratamos com o mesmo respeito, com a mesma honra, pq no tatame todos são iguais
    adorei teu blog ;)


    [b]quer ganhar um seguidor?
    me segue, que eu te sigo!
    http://www.diariodagarotadevariasfaces.blogspot.com/

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  2. Victor, lindo texto, profundo, histórico, a Cidade de Jerusalém foi, e ainda é palco de um embate não só no campo religioso, mas filosófico, bélico entre outros. O engraçado disto tudo é que, os Cristãos, os mulçumanos e os Judeus, que "teoricamente" adoram ao mesmo Deus, não entenderam nada do intento de Deus, que "amar a DEUS acima de todas as coisas e ao próximo como a si mesmo" não surtiu efeito nesses povos, só a ganância de se apossar de um território é que move esses povos através dos séculos.

    Parabéns pelo texto.

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  3. Muito legal seu texto! Gosto de conhecer coisas da idade média!

    passa lá?
    http://uaimeu10.blogspot.com/

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  4. Foi mal; mas eu sempre torci pelos muçulmanos!!! hehehe

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  5. Quantas lições contidas neste texto, hein! Se prestarmos atenção, veremos que podemos tirar lições daí. Belíssima publicação e muito bem contextualizada, Victor. Um grande abraço.

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  6. Legal hein Victor Von Dom Serran, muito legal mesmo! Me ví diante dos cavaleiros nesse duelo!
    Parabens amigão!

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  7. Ótimo blog, parabens!

    Me segue tb?

    http://web-frasesetextos.blogspot.com/

    seguindo cm: 'Mod Cmm's

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  8. Medievalices muito propriamente evocadas num 11 de setembro tão assinalado na história. Gostei montão, teve um sopro de "Cruzada" (a cordial inimizade do protagonista com Saladino, o rei mouro). Bom ver esses embates que fogem crucialmente à covardia nojenta que o dia de hoje vai marcar até o fim dos tempos. Observaçãozinha: em um momento você escreveu "convergentes", mas acredito quisesse expressar "divergentes", não? Beijos e sucesso no blog!

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  9. Bah, tu escreve muito bem adoro textos nesse estilo, muito bom mesmo! *-*

    http://apaixonadasporcosmeticos.blogspot.com/
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    @Ap_Cosmeticos

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  10. Olha o André ai pra me confundir...rs

    Victor.. te enviei um e-mail me desculpando
    pelos (dois ) enganos que cometi.

    Bom que vindo até aqui. Não podia ter perdido esta oportunidade de ler este tua tão bela cronica.

    Falando do texto.. prendeu minha atenção desde a primeira frase. Quase nem respirei querendo saber o final.

    Não torci para nenhum dos lados..pois os dois eram guerreiros honrados.

    Mas o que dizer?

    Na minha ingenuidade..acho que eles poderiam tr se olhado e desistido do combate.

    Sempre é tempo né?

    Muitas lições na sua escrita.

    Uma bela semana a vc..

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  11. Muito bom! Excelente noção de nobreza, o que está faltoso nos dias de hoje.

    Até...

    Ah, poste sim, eu custei um pouco para postar aquele texto no versosprosasecoloquios, e acho q ele ainda merece acréscimos para ter tudo o que eu realmente esperava transmitir.

    Sucesso!

    Bj

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  12. Muito bom , Eu realmente gosto de documentos que relatam batalhas épicas e históricas ou façam menção a elas , esse texto foi muito bem feito e mantendo o conceito de Cavaleiro que é a honra, dignidade, respeito, igualdade, hierarquia, etc... faz o acontecimento ter mais contexto e ser mais realista.
    (Também me vi diante dos cavaleiros nesse duelo.)

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  13. EXCELENTE VICTOR! ESSE SIM É UM VERDADEIRO DUELO DE GIGANTES. VOU CRIAR MAIS UM DO CAVALEIRO VON SERRAN EM BREVE.

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  14. Victor, tens razão!
    Sim... tens razão quando disse lá no Humoremconto que talvez eu não gostasse..., realmente, não gostei mesmo.
    ADOREI!!!! rsrs

    É um conto de aspectos simbolistas, cuja reflexões transcendem o escrito, e isso é literatura.
    A parte da retirada do peitoral, na minha opinião, é o âmago da narrativa, naquele momento, o texto fala por si!
    Muito bom e visual, não ficou cansativo.
    PARABÉNSSSS!!!!!

    Beijinhos e ótima semana!

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  15. Olá menino
    Uma verdadeira viagem no tempo. Texto envolvente, que pudi visualizar toda cena descrita. Parabéns.
    Bjux

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  16. Foi uma ótima narração! Esse respeito mútuo entre adversários é admirável. Só é uma pena que esse exemplo não seja seguido nos dias de hoje e essa batalha em nome da religião tenha perdido toda sua dignidade (na verdade, acho que ela nunca teve tal dignidade).
    Hoje, o inimigo é alguém que deve ser odiado simplesmente pelo fato de existir, e deve ser exterminado.

    Ótimo post.
    Até a próxima.

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  17. por mais que versões modernas tentem reduzir e generalizar as cruzadas à mera pilhagem, grandes guerreiros de ambos os lados se bateram pela conquista da terra santa, aquele pedacinho de chão que foi escolhido por três grandes religiões para ser sagrado. e assim, esse pedacinho sagrado de chão se encheu de sangue por várias e várias vezes.
    belo relato de uma luta em que a honra é mais alta que a vitória. Com certeza vários embates assim ocorreram durante as cruzadas.

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  18. Essa proposta de escrever baseado em fatos reais é deveras interessante. A história nos apresenta apenas fatos, mas como isso se deu? O que conversaram, pensaram? Isso deixamos para a nossa imaginação. Vale a pena parar um pouco, desacelerar um pouco para ler um bom texto como esse. Victor, como sempre se superando! Parabéns
    Abração e obrigado pelas visitas e comentários em meu blog.
    Até o próximo.

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  19. Olá querido, estou devolta, tava com saudades dos seus post.
    Como sempre arrazando no que escreve. A respeito do que vc escreveu, a guerra por si na minha opinião é um desperdicio de vidas, disperdicios de sonhos, familias, enfim, a guerra é sem nexo. Milhares de pessoas morrem por nada, essas pessoas que morrem são apenas peões nas mãos dos "poderesos" que arrumam confusão por pouca coisa, coisas essas que muitas vezes nem são para o bem estar daa população desse pais. Mas acredito em Deus e em seu poder, ele fará essas guerras acabarem, essas perdes de vidas, amor, sonhos, enfim, ele acabará com todo mal do planeta e assim só reinará a paz, o amor, felicidade, etc.

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  20. DEPOIS DE LER O COMENTÁRIO, PASSA LÁ:
    http://thebigdogtales.blogspot.com/2011/09/desejo-de-loucura-total-ou-ode-ao.html

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